Qualificar os professores da rede pública para que os estudantes possam ter um ensino de qualidade sempre foi um desafio no Brasil como um todo. E no Amapá, esse desafio era ainda maior em 2014, quando o estado apresentava uma nota 4 no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Foi aí que um projeto do Rotary Club de Macapá entrou em cena para desenvolver professores da rede municipal e trazer novas formas de ensino ao estado.
O Ideb mede a qualidade do ensino e tem uma escala de zero a dez. Enquanto o Amapá apresentava nota 4 em 2014, o Paraná e Minas Gerais, estados que lideravam o ranking do país, tinham nota 6,2.
Cristina Gradella, associada do Rotary Club de Macapá, conta que, naquela época, seu clube estava em busca de um novo projeto e acabou cruzando com a oportunidade de realizar uma qualificação para professores que mudaria a forma como estes docentes trabalhavam com seus alunos.
“A professora Iolanda Martins, que atuava no interior do estado buscou o clube com a ideia de fazer uma pós-gradução de ‘Professor Coach’. Ela conhecia uma voluntária da Finlândia e alguns professores de São Paulo, e nos fez essa proposta”, explica Cristina. Interessados em desenvolver o projeto, os associados do clube de Macapá, que contava com três pedagogas, começaram a trabalhar para tornar o curso realidade.
O projeto contou com diferentes parcerias, uma delas foi com a Universidade Cândido Mendes, que deu forma ao curso de pós-gradução “Professor Coach – A arte de potencializar habilidades em sala de aula”. Era uma pós que não existia e foi criada para atender as necessidades dos professores do Amapá.
“O professor coach trata da integração de professor e aluno na sala de aula voltada para a criatividade, para abrir os horizontes do aluno. Há mais integração entre professor e aluno, para que o aluno se apaixone pela escola”, conta Cristina.
A outra parceria foi com a Embaixada da Finlândia em Brasília, que desenvolveu toda a agenda de estudos e visitas técnicas que seria realizada pelo grupo de professores do Amapá no país nórdico.
O curso de pós-graduação começou no segundo semestre de 2015 com aulas presenciais realizadas dentro de uma escola estadual em Macapá.
O grande diferencial do curso, porém, veio em 16 de abril de 2016, quando um grupo de 59 pessoas, das quais 47 eram professores da rede municipal de Macapá, embarcaram para a Finlândia a fim de conhecer e aprender sobre seu sistema educacional, o mais avançado do mundo.
Com investimento de US$ 232 mil, este foi o maior projeto do Rotary International no Brasil na área de educação. Os recursos foram aportados pela Fundação Rotária e pela embaixada da Finlândia no Brasil.
Joyce Ferreira de Sousa, pedagoga e uma das professoras participantes do projeto, conta que, durante a viagem à Finlândia, os professores puderam aprender sobre como aquele país utiliza uma mistura de metodologias que tem o aluno sempre como protagonista.
“Por exemplo, o aluno tem um problema ambiental em seu bairro. O professor vai instigar o debate, mas é o aluno que reflete e busca a solução. O professor não dá a resposta, quem tem que encontrar as repostas para os desafios cotidianos é o aluno”, diz.
Durante os dez dias que passaram na Finlândia, os professores fizeram visitas as escolas, creches, universidades e assistiram palestras no Ministério da Educação.
“Lá, não há disciplinas fechadas, eles juntam tudo. Eles têm um problema e juntam química, física, matemática para resolver. A maior parte do tempo, os professores (de diferentes disciplinas) estão juntos na sala de aula”, destaca Joyce.
Ao refletir sobre a principal diferença entre o ensino finlandês e o brasileiro, Joyce reforça a importância dessa integração entre as matérias e como elas são ensinadas aos alunos. “Não existe aquela fronteira entre disciplinas, eles têm uma transdisciplinaridade na prática, não apenas na teoria, como temos aqui”, aponta.
Ao retornar ao Brasil, o grupo deu seguimento aos seus estudos no Amapá, mas também trabalhou no compartilhamento do aprendizado que recebeu na Finlândia.
“O conteúdo foi replicado para 25 professores voluntários”, destaca Cristina. Ela explica que o conteúdo da pós-graduação foi repassado a estes professores em oficinas de capacitação realizadas aos finais de semana, e que foram ministradas pelos docentes que viajaram à Finlândia.
Mesmo tendo sido ministradas apenas na capital, as oficinas beneficiaram professores que residiam em outras cidades do Amapá, como Santana, Mazagão e Porto Grande. Todos os docentes participantes das oficinas eram professores de escolas municipais.
“Acho que o Rotary, com esse projeto, deu um grande impulso na educação do Estado. Houve uma mudança de visão (dos professores sobre o processo educacional). Eu vejo um outro ânimo na educação”, avalia Cristina.
Joyce conta outros detalhes de como os conhecimentos adquiridos no exterior foram aplicados à realidade dos professores e alunos do Amapá. “Buscamos trabalhar com os professores de 3º ao 5º ano música, conto, arte, teatro e poesia. Fomos buscando músicas e contos regionais. A partir dessas oficinas, aplicamos a metodologia do curso de coach”.
A metodologia repassada a outros professores foi aplicada em sala de aula e gerou resultados positivos.
“Temos muitos alunos com dificuldade de alfabetização. Muitos alunos tinham até medo de falar e, depois do projeto, já conseguiam se expressar porque se desenvolveram por meio da música e do teatro. Isso quebrou uma barreira na mente do aluno”, explica Joyce.
Ela ressalta que o projeto incentivou os professores a fazerem coisas diferentes em sala de aula, motivando os alunos.
“Quando um aluno entende e consegue interpretar um texto é um salto enorme. Muitos alunos que tinham problema de violência no lar conseguiram compartilhar isso. O aluno conseguiu passar para o desenho o porquê ele estava triste. São situações que o ensino tradicional não te dá oportunidade de fazer o aluno expressar o que ele sente”.
Segundo Cristina, as escolas participantes do projeto conseguiram melhorar suas notas na edição seguinte do Ideb, em 2016. A nota média geral do estado do Amapá naquele ano ficou em 4,7.
O projeto também trouxe outras oportunidades à vida da professora Joyce, que se associou ao Rotary e agora contribui com outras ações da organização em seu estado.